09/09/2015
Entrevista: Anselmo Barbosa Caires
Barragem vira polêmica na Bahia
“Do jeito que está, eu acho difícil a conclusão e o êxito deste projeto. Será necessária a criação de outras ações, além da construção de uma adutora”.
Nesta entrevista, o atual presidente do Comitê das Bacias Hidrográficas dos Rios Santo Onofre e Paramirim – CBH Paso, principais afluentes da margem direita do rio São Francisco, Anselmo Barbosa Caires, explica os motivos que levaram o comitê estadual pedir a suspensão do projeto para a construção de uma adutora que prevê o abastecimento de água dos municípios baianos de Rio do Pires, Ibipitanga, Macaúbas, Oliveira dos Brejinhos, Boquira e Ibitiara, no sudoeste do Estado.
Um conflito pelo uso da água está instalado na bacia dos rios Paramirim e Santo Onofre, na Bahia. O que ocorre?
O conflito acontece especificadamente na bacia do Paramirim, onde está localizada a barragem do Zabumbão. Ela foi construída pela Codevasf, sendo de domínio federal. O que ocorre é que o governo estadual, sem nenhuma consulta prévia ao comitê de bacia e à sociedade civil, lançou um edital “goela abaixo” para a construção de uma adutora (retirada de água), que prevê o abastecimento de mais seis municípios da região, fora os quatro que já são atendidos pelas águas da represa (Paramirim, Caturama, Botuporã e Tanque Novo). Criou-se um cenário de pânico, haja vista que a barragem do Zabumbão não tem água suficiente para atender a toda essa população.
Por que tanto a população de Paramirim quanto o CBH Paso são contrárias ao projeto?
A posição do comitê é de gerir o problema, já que a população levantou a bandeira de não aceitar esse projeto. O comitê não é contra o desenvolvimento do Vale do Paramirim e da bacia; a entidade preza a segurança hídrica. E com esse projeto nós não enxergamos nenhuma garantia hídrica. Tem município que não precisa de água, nunca reclamou de falta, a exemplo de Macaúbas. Ele será um dos contemplados pelo projeto. O governo jogou várias cidades para justificar o valor dos recursos envolvidos.
A pretensão do governo da Bahia é investir, com recursos da União, cerca de R$ 160 milhões nas obras, garantindo o abastecimento de água da população de seis municípios, atualmente atendidos por carros-pipa. Isso realmente acontecerá?
Do jeito que está, eu acho difícil a conclusão e o êxito deste projeto. Será necessária a criação de outras ações, além da construção de uma adutora. Essa adutora secará o Zabumbão, prejudicando o abastecimento das quatro cidades já abastecidas pelo açude. Foi solicitado pelo governo do estado aumentar a atual captação de água do reservatório (vazão) de 100l/s para 523,9l/s, a fim de atender ao projeto. Isso é inviável, uma vez que a barragem está há mais de cinco anos sem atingir volume superior a 50% da sua capacidade. O comitê e a população não aceitam isso.
No seu entendimento, qual seria a solução para atender à demanda de toda essa população, que chegará a 200 mil moradores do semiárido baiano?
Não seria necessária a implantação de um projeto como este. Bastaria realizar a modernização da irrigação do Vale do Paramirim, que são 1.300 hectares irrigados por inundação. Gastaria algo em torno de R$30 milhões. Além disso, promover ações de esgotamento sanitário a montante do Zabumbão, bem como construir duas novas barragens nos rios da Caixa e Remédios, afluentes do Paramirim. Isso bastaria. O governo do estado, a partir de recente deliberação emitida pelo comitê, na qual pedimos a suspensão do edital caso não fossem atendidas essas demandas, incluiu as solicitações no projeto, mas não garantiu os recursos, apenas manteve o da adutora. Somos contra. Só a adutora, é jogar dinheiro fora.
O Comitê do São Francisco iniciou a discussão sobre o caso no âmbito da sua Câmara Técnica Institucional e Legal, a CTIL. Qual posicionamento vocês esperam da instituição?
Creio que a CTIL, com todo o seu conhecimento jurídico, possa fazer valer a viabilidade técnica do projeto; provar que não se faz políticas públicas de cima para baixo. A câmara técnica do CBHSF poderá dar exemplo para o país deste primeiro grande conflito pelo uso da água de um comitê afluente do Velho Chico.
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